quinta-feira, junho 17, 2010

ritmos de la ciudad



em pensar que um dia, toda essa festança de condomínios e luzes coloridas já me emocionaram tanto; emoção de inflar o peito, quando a suburbana virou o jogo, saiu de viamão e, finalmente, pertenceu à cidade. agora, enfim, aos doze anos incompletos, estava radicada em porto alegre; (?) era toda dona da noite dos sonhos - habitada por gente nas ruas, movimento o tempo todo; ficava pejada de orgulho - ó aceleração citadina do não-pode-parar das loucas avenidas cruzadas! e eu possuía uma - em que fui morar. havia um viaduto iluminado bem na frente da janela. guria de cidade, eu.

e a arte! a arte estava comigo. a Arte, por tudo, uma relação simbiótica fantástica - às paredes, que telas! cinzentas e tanto - putinhas exibidas e sem vaidade nenhuma, oferecidas ao pixo das gentes-cachorro marcarem seus territórios - limitações do grito mudo e da letra feia, de desenhos escorridos no susto dos que gostam temer.


eu? eu finalmente pertencia. fazia parte dos poleiros alinhados, morava em um deles - em geral, duros, inquebrantáveis muralhas de silêncio quebrado apenas pelas vozes metalizadas dos interfones que emitiam som um de fúria desconfiada atrás das portas de ferros.





hoje, o peito que tanto inflou, tanto se emocinou a esse pertencimento Perestroika, está na direção contrária - plasmolisado feito uma ameba seca, seca de tristeza por longe estar do seu habitat - e que mesmo aos tropeços, se adapta, tem sempre na manga seus mecanismos de defesa, justamente por saber fingir bem que ser atropelada por pessoas é normal, ver mendigos pelos quatro cantos implorando um reles níquel -"faz parte", atravessar a rua e quase ser esmigalhada no sinal ao pedestre é questão de detalhe; que a guerra civil é um teatro de módica entrada; sim, saber sim, fingir! ser boba-cega - deixando evidências simbólicas passarem batido na minha vista grossa que não percebe percebendo o quê das relações descartáveis em que me emaranhei por gosto, mesmo sabedora de suas datas de validade a expirar.

mas foi bom. claro que foi. ser boba, ser cega. ser boa. o parvo sempre sofre menos.


hoje, a cidade me mata mais, me mata todo dia um pouco-muito. e pode crer que dói. me mata num perto de longe alcance. cada dia, uma facada a mais. e o corpo resiste às estocadas - afinal, sou uma estóica com tronco de árvore centenária para proteção aos lenhadores de machado. e, nesse ínterim, nessas minhas levas de lamúria e resistência que se multiplica a cada esquina transida de sufoco - algo - de repente, despertou em mim quando um amigo falou:


"- será a cidade ou tu, mariana, que te fazem mal?"


sinceramente?




os dois.

mas eu resisto.